Embora de uso corrente, sobretudo fora dos meios acadêmicos,
enfarte não é o mesmo que
infarto.
Idel Becker e Mangabeira Albernaz, ambos médicos e filólogos, estudaram detidamente esta questão e concluíram pelo que acabamos de afirmar.
O termo infarto já existia na língua portuguesa muito antes de enfarte, constando dos dicionários de Domingos Vieira e de Correia de Lacerda. Somente a partir de 1881, com a publicação do dicionário de Caldas Aulete começa a aparecer a forma enfarte com o mesmo sentido de infarto.
Infarto vem do latim
infarctus e não de fartar ou enfartar, como entendem alguns autores.
Pedro Pinto, que grafa
enfarto em lugar de
infarto, diz: "É errônea a terminação e adotada a conta de étimo fantástico. Não se liga ao verbo enfartar e sim ao latim infarctus".
O Dicionário Escolar da Língua Portuguesa, editado pelo Ministério da Educação, esclarece suficientemente a questão.
Lê-se no citado dicionário:
"
ENFARTE, s.m. Ingurgitamento; inchação, o mesmo que enfartação e enfartamento; (Med.) divulgou-se amplamente essa designação para mencionar a necrose em conseqüência de supressão da circulação de um território vascular, que mais propriamente se deverá dizer infarto".
"
INFARTO, s.m. (Med.) Área hemorrágica ou necrótica por falta de circulação. Embora o Vocabulário da Academia Brasileira de Letras consigne somente enfarte, é de se adotar para este sentido exclusivamente a forma infarto, que corresponde exatamente ao quadro histopatológico que se quer designar, ao passo que enfarte significa ingurgitamento, inchação".
A trombose e o infarto podem ocorrer em qualquer órgão, porém, dada a importância da trombose coronariana, quando se diz simplesmente infarto subentende-se infarto do miocárdio.
Segundo Major, o primeiro autor a descrever a trombose da artéria coronária foi Hammer, em 1878. Dock, em 1896, empregou a expressão
infarto agudo do coração e Osler, em 1910, referiu-se ao
infarto agudo do miocárdio (acute infarct of myocardium).
Posteriormente, autores de língua inglesa passaram a usar myocardial infaiction.
O termo enfarte é de uso bem antigo em português, porém sempre com o sentido de aumento de volume, enchimento, repleção, tumefação.
Veja-se, por exemplo, o que se encontra no Dicionário de Medicina Popular, de Chernoviz: "Enfarte do baço - V. Hipertrofia".
"Enfarte do estômago - V. Embaraço do estômago".
"Enfarte do fígado - V. Hipertrofia".
"Enfarte do testículo - Inflamação crônica do testículo. V. orquite crônica".
No passado usou-se enfarte do estômago como sinônimo de indigestão. A dificuldade no diagnóstico diferencial entre distúrbios gástricos e cardíacos, na era que antecedeu ao advento do eletrocardiografia, poderia, talvez, levar ao uso generalizado de enfarte para ambas as condições.
No presente só se justifica o uso de enfarte e seus cognatos, como enfartar, enfartado, enfartamento, com o sentido de ingurgitamento, tumefação, aumento de volume, repleção. Ex.: enfartamento ganglionar; gânglios enfartados.
Os cardiologistas brasileiros têm demonstrado clara opção pela forma infarto para designar a necrose isquêmica do miocárdio, conforme se pode constatar nas publicações da especialidade.
As formas paralelas infarte e enfarte, por conseguinte, não têm razão de ser, e devem ser excluídas da linguagem médica. Editado do http://usuarios.cultura.com.br/jmrezende/infarto.htm