Implantação do curso de Medicina no Campus de Lagarto não obteve apoio do Conselho Federal de Medicina (CFM).
O presidente do Conselho Federal de Medicina (CFM), Roberto Luiz D’Avila, encaminhou uma resposta negativa ao governador Marcelo Déda (PT) quanto ao seu pedido de apoio para a implantação do curso de Medicina no Campus da Universidade Federal de Sergipe (UFS) em Lagarto. Esta reportagem do Correio de Sergipe teve acesso, com exclusividade, a toda documentação que comprova a informação.
Ao justificar a negativa, Roberto Luiz justificou com o que ele entende por “condições inadequadas de trabalho” para a categoria, além da carreira de Estado que reflita a dignidade da profissão médica, ou seja, em quatro anos praticamente o governo Déda não cumpriu o compromisso de, encaminhar para a Assembleia Legislativa, um plano de cargos e salários para os profissionais da Saúde pública de Sergipe.
Ao responder ao ofício do governador, o presidente do CFM disse que “informamos que o Conselho Federal de Medicina é favorável a abertura de escolas médicas somente em locais que justifiquem a necessidade social e condições de formação adequada, dentre elas a existência de Hospitais Universitários”.
“Em relação à falta de médicos no interior do Estado, onde nossos dados informam que 92,4% dos médicos residem na capital, o que ocorre é uma evidente má distribuição por falta, certamente, além de condições inadequadas de trabalho, constata-se ausência de carreira de estado que reflita a dignidade da profissão médica. Com certeza, quando o Governo de Sergipe resolver esta situação não faltará médico no interior do Estado”, completou o presidente do CFM.
A decisão praticamente inviabiliza a realização do Processo Seletivo Seriado 2010 (PSS) do Campus de Ciências da Saúde de Lagarto, que continua sem data prevista para acontecer. O PSS estava previsto para ocorrer agora em julho, mas já se cogitava um atraso para agosto. A realização do Vestibular e o início imediato das aulas foi um compromisso assumido pelo governador Marcelo Deda.
Durante os governos anteriores, o Partido dos Trabalhadores fez duras cobranças pelo plano de cargos e salários dos profissionais de Saúde. Já no comando do Estado, Marcelo Déda também se comprometeu com a categoria, mas até agora não encaminhou para a Assembleia Legislativa um projeto de lei para a apreciação dos parlamentares. O plano de cargos e salários tem sido o objeto da cobrança da bancada de oposição ao longo desses anos, em especial, pelos deputados estaduais Augusto Bezerra (DEM), Venâncio Fonseca (PP) e Goretti Reis (DEM).
Governo do Estado – Ao formular o pedido ao CFM, Marcelo Déda destacou que seu governo vem realizando uma série de investimentos visando a ampliar a rede de atenção á saúde, citando que se encontra em processo de construção, ampliação ou reforma, 102 Clínicas de Saúde da Família, nove Unidades de Pronto Atendimento, quatro hospitais regionais e três hospitais de alta complexidade, compreendendo tudo isso em um investimento superior a R$ 130 milhões.
Marcelo Déda ainda coloca que “para a plena implantação da reforma e para o bom funcionamento das novas unidades, o Governo do Estado depara-se com a carência de profissionais na área médica. Adianto, no entanto, um dos motivos que provocam a carência: a existência de apenas dois cursos de Medicina em funcionamento no Estado, sendo público apenas um deles”, disse o petista, ressaltando que seu governo se empenha em promover uma profunda reforma sanitária em Sergipe.
O governador usa como justificativa pelo curso de Lagarto a necessidade de descentralizar as ações de saúde e, direção ao interior do Estado. “É fato muito conhecido que os médicos em Sergipe concentram suas atividades laborais na capital, seja pelo fato de o mercado de trabalho ter melhores condições e ser mais especializado, seja pelo hábito cultural relacionado ao acesso a bens e serviços mais sofisticados. Não fazem parte dos anseios profissionais fixar residência e atuar no interior, porque trabalhar na capital está relacionado ao reconhecimento do sucesso profissional”.
Por fim, o governador chega a colocar em “cheque” a capacidade dos profissionais médicos sergipanos. “Outro tema a ser enfrentado é a atitude dos profissionais de saúde em geral, e dos médicos em particular, cujas práticas guardam um grau de degradação dos valores éticos e falta de compromisso com o cuidado aos pacientes, configurando uma prática médica degradada, que atua, por um lado, com um paradigma científico defasado e, por outro, como uma prática técnica e ética não comprometida com o cuidado do paciente”.
“A maior parte dos profissionais médicos é formada em nossas escolas sob a égide do trabalho médico liberal, num paradoxo enorme em relação aos cenários de ensino, a maioria deles realizada em serviços públicos do SUS. Boa parte dos docentes e estudantes conhece parcialmente a rede de serviços pública, pois sua formação está concentrada no hospital universitário, que nem sempre tem uma integração efetiva com o SUS”, completa o governador.
Cremese – Na última quarta-feira (21), o presidente do Conselho Regional de Medicina do Estado de Sergipe (Cremese), Dr. Henrique Batista e Silva, publicou uma nota esclarecedora para a população sergipana. Apesar de compreender e estimular os investimentos do Governo do Estado na ampliação da rede de atenção à saúde da população, entende que a “justificativa” do governador Marcelo Déda, para conseguir a implantação do curso de Medicina em Lagarto, “agride gratuita e espontaneamente, mais uma vez, os profissionais de saúde em geral e em particular os médicos quando numa generalização absurda e injusta”.
Henrique Batista diz ainda que desta forma, o Governo de Sergipe despreza todos aqueles profissionais, que lutam diuturnamente contra a morte junto aos seus pacientes, em hospitais públicos desaparelhados, vivendo verdadeiro caos administrativo, como comprovado em sucessivas fiscalizações conjuntas realizadas pelo Conselho Regional de Medicina/SE e Ministério Público Estadual. “Atinge ainda, em flagrante falta de justiça e bom senso, o Curso de Medicina da Universidade Federal de Sergipe que em 2011 fará 50 anos de relevantes serviços prestados ao Estado, responsável pela formação de 64% dos médicos em atividade no Estado de Sergipe, lançando-lhe a pecha descabida e injusta de uma prática médica degradada, com um paradigma científico defasado, com um Hospital Universitário que nem sempre tem uma integração efetiva com o Sistema Único de Saúde”.
O presidente do Cremese coloca também que “em relação à falta de médicos no interior do Estado, dados informam que 92,4% dos médicos residem na capital, mas grande parte desses deslocam-se diariamente aos municípios aonde exercem suas atividades, pela facilidade proporcionada pelas curtas distâncias dentro do Estado. A distribuição dos profissionais certamente não é melhor, pelas condições inadequadas de trabalho com baixo padrão técnico resolutivo, precariedade e insegurança nos contratos trabalhistas e ausência de carreira de Estado aos moldes do Judiciário, que reflita a dignidade da profissão”.
Ele encerra a nota, mandando um recado duro para o governo do Estado. “Com certeza, criadas tais condições pelo Governo, não faltarão profissionais, inclusive oriundos de outros Estados. Inaceitável é, na justificativa de um projeto, a agressão generalizada à classe médica e sua instituição formadora, que mantém a saúde do Estado – as quais não podem ser responsabilizadas pelo caos administrativo vigente”.
Ápice – O auge da polêmica veio à tona com a publicação do artigo “Governador Déda e a UFS versus os médicos de Sergipe”, no site do Sindicato dos Médicos do Estado de Sergipe (Sindimed/SE), de autoria da médica e da presidente do Círculo Brasileiro de Psicanálise, Déborah Pimentel, que ensina Medicina Legal e Ética Médica no Departamento de Medicina da UFS.
Fonte: Jornal Correio de Sergipe
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