14 junho 2010

[Artigo] O perfil do Médico a ser formado no novo projeto de gradução em Medicina

Resumo

As orientações atuais em relação ao ensino de Medicina preconizam que é preciso formar um médico comprometido com a promoção da saúde e a prevenção de doenças, além dotá-lo de uma visão ética e atenta às necessidades da comunidade na qual atua. As atuais Diretrizes Curriculares do Curso de Graduação em Medicina enfatizam que o egresso deve ter formação generalista. Entende-se, portanto, que a formação médica que serve agora não pode se limitar à informação teórica e ao treinamento clínico e não pode privilegiar a especialização precoce. Por outro lado, a explosão de informações na área médica deve priorizar o processo de "aprender a aprender", com o ensino das técnicas de busca destas informações, assim como da adequada formação para analisá-las criticamente. Formar o médico na atualidade é preparar o estudante para exercer uma atividade complexa e fundamental para a sociedade.

Palavras-chave: Educação Médica. Centros Educacionais de Áreas de Saúde. Estudante de Medicina.

Na área de formação médica, têm surgido muitos questionamentos sobre o perfil do profissional que a sociedade requer, principalmente diante da preocupação com a especialização precoce e ao ensino marcado, ao longo dos anos, por parâmetros curriculares baseados no Relatório Flexner, que se baseou no raciocínio mecanicista da doença, na especialização médica, no diagnóstico técnico-laboratorial, na linguagem objetiva da anátomopatologia (MITRE et al., 2008).

A ênfase na sólida formação em ciências básicas nos primeiros anos de curso, a organização minuciosa da assistência médica em cada especialidade, a valorização do ensino centrado no ambiente hospitalar enfocando a atenção curativa, produziram um ensino dissociado das reais necessidades do sistema de saúde vigente (Ibid).

Conforme as orientações mais atuais da Organização Mundial da Saúde, o médico a ser formado deve ser comprometido com a promoção de saúde e a prevenção dos agravos, além de ser dotado de uma visão humanista e ética e estar atento às necessidades das comunidades na qual atua. Praticamente todas as propostas de reforma curricular em Medicina incluem uma ampliação da formação dos futuros médicos nos aspectos éticos e humanísticos da profissão.

O entendimento anterior de que um médico deve ser preparado para dominar conceitos teóricos e técnicas eficazes para curar doenças e afastar a dor já não serve. Se definirmos a profissão médica como essa capacidade, a formação se esgota na aprendizagem de teorias e no domínio de técnicas de diagnóstico e de intervenção clínica e/ou cirúrgica (PESSOTTI, 1996). Essa definição do perfil do médico baseada nos princípios tecnocientíficos é considerada muito simplista.

Nessa visão, o ensino médico se deteve ao estudo dos aspectos biológicos do ser humano, que de certa forma resultou na formação de "profissionais carentes de mentes questionadoras, sem o desejo e a curiosidade de compreender os fenômenos com os quais se defrontam, incapazes de refletir sobre suas práticas e adequá-las às necessidades de suas comunidades"(MAMEDE, 2001).

Assim, foram necessárias mudanças que levassem em consideração aspectos éticos, humanísticos e a adequação à realidade do sistema de saúde. A proposta estabelecida pelas novas Diretrizes Curriculares do Ensino Médico, homologadas pelo Conselho Nacional de Educação em 2001 (BRASIL, 2001), que atualmente constituem os princípios gerais para a formação médica, sugerem a inserção precoce do aluno em cenários diversificados de ensino-aprendizagem e enfatiza o papel desempenhado pela atenção básica nesse processo.

As Diretrizes Curriculares do curso de graduação em Medicina enfatizam, no artigo 3º, que o egresso do curso de Medicina deve ter "formação generalista, humanística, crítica e reflexiva, capacitado a atuar, pautado em princípios éticos, no processo saúde-doença em seus diferentes níveis de atenção, com ações de promoção, prevenção, recuperação e reabilitação à saúde, na perspectiva da integralidade da assistência, com senso de responsabilidade social e compromisso com a cidadania, como promotor da saúde integral do ser humano".

Ao propor a formação de médicos competentes, éticos, comprometidos com as necessidades de saúde da população, as novas diretrizes curriculares, instigam uma interação ativa entre estudantes, professores, profissionais de saúde e usuários. Assim, novas adequações têm sido propostas com o intuito de se chegar a esse objetivo (NOGUEIRA, 2009).

Segundo Kira e Martins (1996), algumas estratégias têm sido implementadas em muitas escolas médicas no Brasil, como o treinamento em ambulatório e não apenas em enfermarias e serviços de emergência, a busca da interação com uma equipe multiprofissional e não apenas com médicos, a incorporação dos conhecimentos de epidemiologia à prática clínica, assim como o reconhecimento da importância dos aspectos psicológicos, sociais e culturais nas doenças e nos doentes.

Portanto, entende-se atualmente que a formação médica que serve, agora, não pode se limitar à boa informação teórica e ao treinamento clínico. Agora, formar o médico é preparar alguém para exercer uma atividade complexa, fundamental para a vida e para as realizações da sociedade (PESSOTTI, 1996).

Por outro lado, a explosão de informações na área médica deve levar a uma forma de ensinar que priorize o "aprender a aprender", com o ensino das técnicas informatizadas para a busca destas informações, assim como formação para analisá-las, de forma a responder perguntas clínicas específicas, se impõe no ensino médico atual. A Medicina Baseada em Evidências é, pois, um paradigma a ser progressivamente empregado para permitir um trabalho ordenado e crítico da enorme quantidade de novas informações médicas que se acumulam mês a mês.

O novo currículo do curso de Medicina da Universidade Federal da Paraíba (UFPB) está atualmente no sétimo semestre e insere os estudantes na comunidade desde o primeiro período do curso. A criação de novas disciplinas para os primeiros anos da graduação, com enfoque na promoção e educação em saúde, propicia a inserção do estudante precocemente em atividades práticas relevantes para a sua futura vida profissional, permitindo-lhe conhecer e vivenciar situações variadas de vida e incentivando sua interação ativa com usuários e profissionais de saúde desde o início de sua formação.

Com a recente implantação do novo Projeto Pedagógico do Curso de Medicina (PPC) na UFPB, ao contrário de aulas estruturadas por disciplinas, passou a existir um currículo baseado em módulos de conhecimento. Entre as alterações mais significativas figura a inserção precoce dos alunos na rede básica de saúde, o que busca propiciar a compreensão precoce das circunstâncias ambientais, sócio-culturais e econômicas das quais emergem as condições de saúde e seus agravos. Esta inovação tem o objetivo de se conseguir que os alunos tenham uma visão holística, valorizando as ações de promoção e prevenção, tanto quanto as de recuperação e de reabilitação. Esse objetivo é um dos principais desafios da reforma da educação médica.

Referências

BRASIL. Ministério da Educação. Conselho Nacional de Educação. Câmara de Educação Superior. Resolução n.4, CNE/CES de 7/11/2001. Diretrizes curriculares nacionais do curso de graduação em medicina. Diário Oficial da União. Brasília, 9 nov. 2001; Seção 1, p. 38. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/cne/arquivos/pedf/CES04.pdf Acesso: 02 jun 2010.
MAMEDE, S.; PENAFORTE, J. (Org). Aprendizagem baseada em problemas: Anatomia de uma nova abordagem educacional. Fortaleza: Hucitec, 2001.
MITRE, S. M. et al. Metodologias ativas de ensino-aprendizagem na formação profissional em saúde: debates atuais. Ciênc. saúde coletiva 13 (suppl. 2): 2133-2144, 2008. NOGUEIRA, M. I. As mudanças na Educação médica em perspectiva: Reflexões sobre a emergência de um novo estilo de pensamento. Rev. bras. educ. med. 32 (2): 262-270, 2009.
KIRA, C. M; MARTINS, M. A. O ensino e o aprendizado das habilidades clínicas e competências médicas. Medicina Ribeirão Preto, 29: 407-413, 1996.
PESSOTTI I. A formação humanística do medico. Medicina Ribeirão Preto 29: 440-448, 1996.


Mara Rufino de Andrade
Estudante do Internato do Curso de Graduação em Medicina da UFPB

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